No primeiro bimestre, estudamos a 1ª e 2ª
fases do Modernismo, suas características e seus principais autores. Agora,
vamos avançar e estudar o pós-modernismo, especificamente a última fase:
geração de 45.
A época em que aparece e se desenrola o
pós-modernismo literário é de muitas mudanças no Brasil e no mundo,
principalmente com o fim da Segunda Guerra Mundial. A partir de 1945, aparece
no Brasil uma geração de escritores sintonizados com o pensar sobre o homem e
sobre o mundo, isto é, sobre o que abala a nossa alma.
Tanto na prosa quanto na poesia, os
autores desta geração procuraram experimentar novas formas de composição,
usando a linguagem de forma diferenciada para mostrar seus objetivos.
Na prosa, podemos destacar: Clarice
Lispector, Guimarães Rosa, Ariano Suassuna entre outros.
Para
que possamos entender as características literárias desta geração, vamos propor
a você que leia dois fragmentos do Romance Grande Sertão: Veredas de
Guimarães Rosa. Antes, porém, que tal conhecer um pouco sobre o autor?
João Guimarães Rosa nasceu
em 1908 em Cordisburgo (Minas Gerais).Na infância conviveu com vaqueiros de
quem ouvia os “causos”. Este autor renovou, reinventou a prosa regionalista, ao
inserir temáticas de ordem mística e filosófica nas suas narrativas. Além
disso, o trabalho que autor faz com a linguagem é impecável, pois cria
palavras, modifica a ordem das mesmas. Guimarães Rosa aborda as questões
regionais e, ao mesmo tempo, tenta mostrar o mundo de cada personagem, a
universalidade.
Trecho I
De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar
não pensava. Não possuía os prazos. Vivi puxando difícil de dificel, peixe vivo
no moquém: quem moi no asp’ro, não fantaseia. Mas, agora, feita a folga que me
vem, e sem pequenos dessossegos, estou de range rede. E me inventei neste
gosto, de es pecular ideia. O diabo existe e não existe? Dou o dito.
Abrenúncio. Essas melancolias.
O senhor vê: existe cachoeira; e pois? Mas
cachoeira é barranco de chão, e água se caindo por ele, retombando; o senhor
consome essa água, ou desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é
negócio muito perigoso...
Explico ao senhor: o
diabo vige dentro do homem, os crespos do homem – ou é o homem arruinado, ou o
homem dos avessos. Solto, por si, cidadão, é que não tem diabo nenhum. Nenhum!
– é o que digo. O senhor aprova? Me declare tudo,franco – é alta mercê que me
faz: e pedir posso, encarecido. Este caso – por estúrdio que me vejam – é de
minha certa importância. Tomara não fosse... Mas, não diga que o senhor,
assisado e instruído, que acredita na pessoa dele?! Não? Lhe agradeço! Sua alta
opinião compõe minha valia. Já sabia, esperava por ela-já o campo! Ah, a gente,
na velhice, carece de ter sua aragem de descanso. Lhe agradeço. Tem diabo
nenhum. (...)
Guimarães Rosa. Grande
Sertão: veredas. 1994, pp 7-9. Disponível em http://stoa.usp.br/carloshgn/files/-1/20292/GrandeSertoVeredasGuimaresRosa.pdf
Trecho II
Mire veja: um casal, no Rio do Borá, daqui
longe, só porque marido e mulher eram primos carnais, os quatro meninos deles
vieram nascendo com a pior transformação que há: sem braços e sem pernas, só os
tocos... Arre, nem posso figurar minha ideia nisso! Refiro ao senhor: um outro
doutor, doutor rapaz, que explorava as pedras turmalinas no vale do Araçuaí,
discorreu me dizendo que a vida da gente encarna e reencama, por progresso
próprio, mas que Deus não há. Estremeço. Como não ter Deus?! Com Deus
existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve.
Mas, se não tem Deus, há - de a gente perdidos no vai vem, e a vida é burra. É
o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar – é
todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho,
pois no fim dá certo. Mas, se não
tem Deus, então, a gente não tem licença de coisa nenhuma! Porque existe dor. E
a vida do homem está presa encantoada – erra rumo, dá em aleijões como esses,
dos meninos sem pernas e braços. Dor não dói até em criancinhas e bichos, e nos
doidos –não doi sem precisar de se ter razão nem conhecimento? E as pessoas não
nascem sempre? Ah, medo tenho não é de ver morte, mas de ver nascimento. Medo
mistério. O senhor não vê? O que não é Deus, é estado do demônio. Deus existe
mesmo quando não há. Mas o demônio não precisa de existir para haver – a gente
sabendo que ele não existe, aí é que ele toma conta de tudo. O inferno é um sem
-fim que nem não se pode ver. Mas a gente quer Céu é porque quer um fim: mas um
fim com depois dele a gente tudo vendo. Se eu estou falando às flautas, o
senhor me corte. Meu modo é este. Nasci para não ter homem igual em meus
gostos. O que eu invejo é sua instrução do senhor...
Guimarães
Rosa. Grande Sertão: veredas. 1994, pp 77-78. Disponível em http://stoa.usp.br/carloshgn/files/-1/20292/GrandeSertoVeredasGuimaresRosa.pdf
GERAÇÃO
DE 45 – POESIA
Vamos iniciar a nossa aula solicitando a você, aluno, que observe as
palavras abaixo:
“Não há obra de
arte sem forma, e a beleza
é um problema de
técnica e de forma.”
(Péricles Eugênio da Silva Ramos)
O que será que o autor quis afirmar quando escreveu “não há arte sem
forma” e que “a beleza (de uma obra de arte) é uma questão de técnica e de
forma”?
É o que vamos descobrir, nesta aula,
através de uma geração de poetas que ficou justamente conhecida como Geração
de 45, pois o marco da estética foi o ano de 1945.
Esta geração se preocupava muito com a
FORMA de escrever um poema, com a linguagem em si, se propunha um retorno às
formas tradicionais do verso, como o soneto, e negava o experimentalismo dos
modernistas de 1922, por isso ficou conhecida como a geração que diz que “a
poesia é a arte da palavra“. Ou seja, a arte não é intuitiva, é calculada, é
nua, é crua. E como disse o autor Péricles acima, não há obra de arte sem forma,
sem forma calculada.
Do
pensamento dessa geração, podemos então listar as principais características
(procedimentos formais).
Principais
procedimentos formais e linguísticos da Geração de 45
Metalinguagem (reflexão sobre o processo de
criação literária);
Postura
racional, anti-sentimental; Linguagem metafórica ou poética, que relativiza os
limites entre poesia e prosa; Invenção de palavras novas a partir de recursos
disponíveis na língua: neologismo.
Com
a geração de 45, "a poesia aprofunda a depuração formal, regressando a
certas disciplinas quebradas pela revolta de 22, restaurando a dignidade e
severidade da linguagem e dos temas, policiando a emoção por um esforço de
objetivismo e intelectualismo, e restabelecendo alguns gêneros fixos, como o
soneto e a ode". (COUTINHO, Afrânio). Além de renovar a poesia pela
prática da atenção à forma, busca também mensagens de crítica social.
São
poetas dessa época: João
Cabral de Melo Neto, Lêdo Ivo, Péricles Eugênio da Silva Ramos, Domingos
Carvalho da Silva.
Veja,
agora, um exemplo de poesia da geração de 1945:
Catar Feijão
Catar feijão se limita com escrever: jogam-se os grãos na água do
alguidar e as palavras na da folha de papel; e depois, joga-se fora o que
boiar.
Certo, toda palavra boiará no
papel, água congelada, por chumbo seu verbo; pois catar esse feijão, soprar
nele, e jogar fora o leve e oco, palha e eco.
Ora, nesse catar feijão entra um
risco: o de que entre os grãos pesados entre um grão qualquer, pesado ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar
palavras: a pedra dá à frase seu grão mais vivo: obstrui a leitura fluviante,
flutual, açula a atenção, isca-a com risco.
Comentário: Catar Feijão é um poema em que o poeta, tendo
como objeto a construção do poema, toma como referente um ato do cotidiano em
que também o escolher, o combinar é necessário. Nesse caso ele compara catar
palavras com catar feijão. É um poema que ao final nos mostra como construir um
poema, apresentando assim a característica da metalinguagem. Além disso, a
FORMA, o como diz o que diz é o que importa neste poema de João
Cabral de Melo Neto, fazendo dele um autor típico da Geração de 45.
Vamos
agora comentar sobre outra característica desta Geração: o NEOLOGISMO. Veja o
conceito abaixo.
Neologismo: é o processo de criação de uma nova palavra
na língua devido à necessidade de nomear novos objetos, novos conceitos ou
fazer referência a novas ideias em uma situação específica.
Voltemos ao poema Catar Feijão.
Observe os versos:
“a pedra dá à frase seu grão mais vivo: obstrui a leitura fluviante, flutual”
Se
você, caro aluno, for ao dicionário Houaiss, por exemplo, e procurar por fluviante
e flutual não encontrará. São duas palavras criadas pelo poeta, são neologismos construídos a partir das
palavras fluvial (referência a um rio) e flutuante (flutuação própria em um
rio) em que as partes finais das duas palavras, ou seja, neste caso específico,
os seus sufixos, são recolocados no outro termo.
Outro recurso literário utilizado no poema é a metáfora.
METÁFORA: É uma figura de palavra em que um termo substitui
outro em vista de uma relação de semelhança entre os elementos que esses termos
designam.
Fonte
da pesquisa: Atividades Autorreguladas do 2º bimestre – Material didático.